Natal adiado

C.
A vida dá voltas e voltas, trazendo por vezes momentos tão difíceis, tão dolorosos, que pensamos não aguentar.
Mas acontece sempre uma pequena coisa qualquer, que nos empurra para a frente, nos devolve as forças, nos seca as lágrimas, nos faz começar os dias com renovada esperança.
Então, descobrimos que somos mais fortes que as tempestades da vida.
Bom Natal

(para um homem enorme no seu metro e cinquenta e cinco, sensível, solidário, talentoso, com um coração maior que o mundo, que neste momento paga uma pesada multa, mas tem à sua volta para o ajudar a carregar a cruz, uma grande família- do mesmo sangue e não só!)

Natal em mensagem.

R.
Há silêncios que nos dizem muito e solidões que nos enchem a vida.
Pensamos que já fomos tudo o que podemos ser, mas há talentos escondidos no mais íntimo do nosso ser e que esperam apenas pelo momento de nos fazer brilhar.
Procure dentro de si e será surpreendido pela generosidade da Mãe Natureza.
Recuse-se a ser um número.
Recuse-se a parar no meio do percurso.
Recuse-se a aceitar apenas o que lhe dão, lute pelo que merece.
A felicidade vale a pena.
Bom Natal.

(para um actor que fez maravilhas com o meu duende, dizendo sempre "não vou ser capaz")

Mensagem de Natal

F.
Quem nasceu com o dom de criar, nunca está só.
As noites silenciosas são ricas em projectos e os dias solitários ajudam a concretizá-los.
Basta a vontade do homem para que o mundo se transforme.
A cela vazia é jardim florido, a cama estreita passa a baloiço da infância, a janela de grades, veleiro magestoso com velas enfunadas ao vento e na parede nua, em cada alvorada forma-se um arco-íris perfeito.
Mas nem todos temos essa capacidade. O F. foi abençoado.
Bom Natal.

(Mensagem a um pintor que passa por horas difíceis, este Natal.)

Noite de luz.

Aproxima-se de novo a festa da família.
Aproxima-se a data em que fui mãe, tal como Nossa Senhora, na noite de 25 de Dezembro, poucos minutos depois da meia noite.
Quando entrei na sala de partos, a enfermeira disse: -Escusa de ter pressa, porque o Menino Jesus já nasceu. Nasceu um rapazinho agora mesmo, à meia noite em ponto.
Eu só tinha pressa para ver aquela hora passada, confesso.
Não sabia se ia ser um rapaz ou uma menina. Torcíamos para que fosse rapaz, pois já tinhamos a Rita.
O Hospital estava quase deserto. As ruas estavam completamente vazias, entregues às luzes de Natal. Os meus gemidos e depois gritos, faziam eco nos corredores silenciosos.
Foi uma noite especial, que escolhi para dar à luz.
Chovia, fazia muito frio e em todas as casas festejava-se a Consoada.
O médico estava na Missa do Galo.
Eu esperava mais um filho e desejava apenas que fosse saudável e perfeito.
Poucos minutos depois, com o médico assistente ainda em t-shirt, nasceu o Frederico.
Tal como a mãe de Deus, eu tinha o meu menino no colo.
Festeja o aniversário com o Menino Jesus.

Viajar na minha cela

Mergulho no azul do céu, em voos perdidos
Planando como ave sem sentidos

O casaco logo se estende no ar
Como vela de barco no mar.
Elevo meu corpo entorpecido
Conduzem-me ventos amainados
Abro os meus braços já doridos,
De há tanto tempo cruzados.



Doce brisa amorna as águas frias
E eu descanso em almofada de algas macias

Lençóis com barras de espuma rendada
Enfeites de damasco na colcha prateada.
Vagas mansas erguem-me no ar,
Baloiço da minha infância esquecida.
Vem trautear canções de embalar
A Lua Cheia, de suas rotas perdida.



Corro por searas de espigas douradas
Danço, rodopio, marcho em paradas

Rezo ladainhas em claustros de noviças
Caminho por dunas de areias roliças
Movendo-se em ondas sensuais
Do alto dos montes grito a ecos repetidos
Ensaio trinados com pequenos pardais
Canto hinos a amores proibidos



Olho o céu, os montes, imagino o mar
De despedida, um último olhar.

Cerro os olhos e os ouvidos. Suspiro.
Tranco o coração, colo os lábios, não respiro
Na espera da saída, desesperado
Donde nada sou e a tudo me sujeito
Regresso do sonho mil vezes sonhado
E volto a dobrar os braços sobre o peito.

Sensabedoria e Malsabedoria

Podia simplesmente deixar-te um comentário. E não seria aqui.
Mas a tua coragem não está só por aqui. Coragem - esta é a palavra de que a tua escrita se serve, de que a tua vida se serve quando fazes dela um acto como aquele que te li noutro lugar.
Foi no teu companheiro (des)dramatizar, teu companheiro da arte e da sabedoria. Passei por lá há pouco, no teu companheiro blogue. E vi o preço que por vezes se paga a quem não conhece a arte nem jamais alcançará a sabedoria. O preço que pagam as pessoas que fazem da vida a sua coragem - o preço que pagam àqueles que não sentem nem sabem, só mandam.
O preço que pagam os que têm coragem diante daqueles que jamais serão dignos dela, aqueles que, mesmo mandando, sempre lançam a pedra e escondem a mão - aqueles que são cobardes, mas mandam. Mandam, ignorando que são escravos. Porque quem não sente nem sabe, porque quem não conhece a arte nem jamais alcançará a sabedoria, é o mais mesquinho escravo da mais mesquinha condição da animalidade.
O título do teu artigo, no teu outro companheiro blogue, é "Maldade". Mas acredita que é lisongeiro. A maldade é atributo da humana condição - muito menos mesquinha que o ódio do instinto humanóide.
Quando a tua escrita testemunha o sentir e o saber da Vida, nunca falarás para esses que mais não têm que sensabedoria ou malsabedoria. Quando falares disso, quando falares assim, fala para os teus companheiros, fala aqui.
Por isso é aqui que o meu comentário cabe. Aqui, onde estás entre os teus pares.
Por isso prefiro deixar-te uns versos que apenas são meus pela mesma razão que são de toda a Humanidade, a quem os legou a Sabedoria... palavra que nasceu no grego com o nome de Sophia:
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Nunca choraremos bastante quando vemos
O gesto criador ser impedido
Nunca choraremos bastante quando vemos
Que quem ousa lutar é destruído
Por troças por insídias por venenos
E por outras maneiras que sabemos
Tão sábias tão subtis e tão peritas
Que nem podem sequer ser bem descritas
* Sophia de Mello Breyner, Pranto pelo Dia de Hoje
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E se algum dia as forças te faltarem, lembra-te da tua obrigação de testemunhar. Lembra-te da lição de Martin Luther King:
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O que mais preocupa
não é o grito dos violentos,
nem dos corruptos,
nem dos desonestos,
nem dos sem-carácter,
nem dos sem-ética.
...... O que mais preocupa
...... é o silêncio dos bons

Maldade
"Janeiro de 2008.
Uma das prendas que resolvi dar às crianças no "Dia Mundial da Criança", foi uma pequena árvore para plantar no pátio da escola e verem crescer com os seus cuidados. Consegui, depois de imensos telefonemas, 10 árvores com 1,20m de altura, de folhagem verde claro lindíssima, todas iguais, a título gratuito, que considerei uma sorte, uma bênção.
Fiz um texto explicando às crianças, que nós queríamos que elas levassem aquela árvore para cuidarem e ajudarem a crescer, pois mais tarde ela lhes daria sombra, acolheria os pássaros e os seus ninhos, daria oxigénio para respirarem ar mais puro e enfeitaria a escola.
Sobraram 2 árvores. Eu perguntei o que pretendiam fazer com elas. Disseram que seriam dadas à Junta de Freguesia para plantar nos jardins da povoação. Concordei. O Presidente da Junta foi ver as árvores e disse... nada. As árvores ficaram uma semana, um mês, 2 meses... à espera de serem plantadas. Eu perguntei-lhe se não as queria... disse-me que não. Plantar 2 árvores?
Então, vendo as pobres plantas a morrer de sede e de abandono, embora as regasse (o vaso em que estavam era muito pequenino e nos fins de semana ficavam fechadas num gabinete sem ar e muito quente) fui sugerir que se plantassem na quinta. Responderam que não.
Pedi que plantássemos uma perto da escola e me dessem a outra, para plantar no meu jardim e ter uma recordação daquele trabalho. Responderam que não.
As árvores foram secando, apesar de eu ir de vez em quando encher de água o saco de plástico em que meti o vaso, perdendo as folhas e a graça. Mesmo assim, eu sentia que ainda era capaz de as ressuscitar, pois o caule estava verde. Talvez com ar, sol, terra e adubo, elas recuperassem. Acreditem. Deixaram que as plantas morressem. Os vasos foram postos fora da janela, 8 meses depois, para irem no lixo. Estavam sem folhas, os caules castanhos da grossura de um dedo indicador, mas direitas, firmes, ainda muito belas. Morreram, mas continuavam de pé e orgulhosas... Amar a Natureza e os nossos semelhantes!!!
Quem fazia a limpeza não as tirava de propósito, sensibilizado com aquela ordem. Nunca houve um gesto, uma palavra, nada que mostrasse que aquilo incomodava quem ia todos os dias ao arquivo onde elas estavam.
Eram superiores a tudo, a todos, à Natureza, a Deus! Com poder da vida e da morte!!! "

Mais um presente do Tonô.


O meu irmão volta a fazer-me companhia!
Procura as minha escriturices, completa as minhas pesquisas mais descuidadas, deixa-me uma flor, um poema, uma música, um filme.
A surpresa é sempre boa.
Somos irmãos, no verdadeiro significado que essa palavra contém, apesar do mesmo pai, da mesma mãe e da "mesma criação", como dizem no Fundão.
Desde crianças que as nossas conversas se procuram, se cruzam e se entendem. Desde crianças que os nossos gostos coincidem.
Sonhei muitas vezes que sabia tocar piano, admirando-me como era fácil tirar as minhas músicas preferidas daquele intrumento magestoso. Mas nunca cheguei a aprender uma única nota musical.
Ver o meu irmão dominar as teclas de ébano e marfim e interpretar uma partitura, é como se fossem os meus dedos a percorrer as escalas e a encher a sala com as melodias tão familiares. É como se fosse eu que, de repente, descobrisse que sabia tocar piano e exultasse de emoção.
Sabe ouvir as minhas inquietações, tirar as minhas dúvidas, resolver os meus problemas.
Está presente tão facilmente nos momentos em que sofro, como naqueles em que festejo.
Apesar de mais novo, vai mais à frente. Eu caminho devagar. Ele corre.
Todas as paixões que eu tenho sonhado realizar, ele realiza. E eu, conformada, realizo-me nele.
Obrigada. Volta sempre.
( Na foto antiga e divertida, o pormenor das mãos dadas! Parece que te apoias em mim, mas toda a vida tem sido outra a intrpretação que lhe dou. Eu é que te seguro, te sigo, me agarro a ti. Um beijo.)

Inquietações

Sonho fazer de 1964 uma era do século passado

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"Considero-me um sonhador, paguei um preço bastante duro pelos meus sonhos, mas são tão belos, tão plenos e tão intensos que voltaria a pagá-lo uma e outra vez.
(...) não há sonho mais belo do que o de um mundo onde o pilar fundamental da existência seja a fraternidade, onde as relações humanas sejam sustentadas pela solidariedade, um mundo onde todos compartilhemos da necessidade de justiça social e actuemos com coerência.
(...) se não formos terrivelmente audazes com os nossos sonhos e não acreditarmos neles até os tornar realidade, então os nossos sonhos murcham, morrem, e, com eles, nós também."
* Luis Sepulveda, O Poder dos Sonhos

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Passa da uma hora da manhã.
O sono não chega e aproveito para arrumar o meu diário, fiel companhia de tantos momentos.
Admiro-me sempre com isto da internet... neste momento, 9 países lêm o que escrevo. Do Japão ao México, do Uruguai à Itália e à Alemanha. Chego a ficar assustada com tanto poder que tem este pequeno aparelho à minha frente.
E podia ser aproveitado para fazer coisas boas, muito boas.
Eu, que me deparo com tantas dificuldades para realizar os meus projectos, fico aqui a pensar como seria bom ter a ajuda de algumas pessoas por esse mundo fora.
Falei nisso mais atrás - por cada bola colorida, um par de meias quentes.
Podia tornar o Natal dos meus amigos tão necessitados, muito mais Natal.
E quando ajudamos os outros, temos nós também um Natal muito mais Natal.
Lembro-me de quando se via uma criança descalça, nos dias mais frios de Inverno, alguém dizia: -Estão habituados,"Deus dá o frio, conforme a roupa".
O meu pai respondia sempre: -"Pois, dá muito, a quem tem pouca!"

Sabedoria

"A simplicidade é a sofisticação suprema"

Leonardo da Vinci

A Neve na minha terra



O frio gelava-me as mãos, enquanto procurava um pico da Serra da Estrela para fotografar, sem que as nuvens viessem fazer negaças.
Mas valeu a pena.
Aqui está a sua montanha mais alta, a Torre desaparecendo no véu de nuvens, numa beleza que nenhuma máquina fotográfica de amador, como a minha, consegue captar.






A Serra da Gardunha, por ser bem mais humilde, só nos dias mais frios acolhe a neve que a aproxima da magestosa Estrela, logo em frente.
Anoitecia e o brilho da neve tornava-se tímido e silencioso.


Só o vento gélido nos lembrava como ela era branca, macia e fria, muito fria.