As Cores do Sonho

Como oleiro, eu tentei
modelar o mundo com os meus sonhos.
Eu, árvore com ramagens de cores avermelhadas
no outono, caindo na terra fria desmaiadas
Tu, pinheiro altivo, sempre verde, rasgando o céu ,
sem temer ventos em rajadas, ou o peso da neve silenciosa.
Depois, para mim uma flor, talvez o jasmim, o lírio ou a rosa
e para ti, rosmaninho do campo ou alecrim perfumado.
Moldaria uma ave, eu, o pintassilgo talvez
frágil, modesto, mas livre viajante, sempre
entre nuvens ou por mornas correntes levado.
Pintaria com a cor do entardecer
os teus braços onde ele iria adormecer.
O céu de azul claro, suave como um sorriso,
nuvens como véus de noiva, em bailado,
por do sol em matiz alaranjado, cor de fogo como o nosso sentir
De negro, a noite, para contar as estrelas, de mãos dadas
Rosado o horizonte ao amanhecer, com risadas
Modelaria o mar, que pintaria com a cor dos meus olhos
E tu, o barco, que viria nele ancorar.

Mª Suzete 28.08.2011


Goethe

HISTÓRIA DE UM POEMA COM FOLHAS DE ÁRVORE-AVENCA

No dia 15 de Setembro de 1815, o poeta alemão Johann Wolfgand von Goethe escreveu um poema para a sua namorada Marianne von Willemer. Inspirou-se numa Árvore-Avenca (Gingko biloba) que viu no jardim do castelo de Heidelberg. No dia 23, encontrou-se com Marianne pela última vez e mostrou-lhe a árvore. No dia 27, enviou-lhe o manuscrito, ao qual juntou... duas folhas dessa árvore.
A árvore tem muitas outras particularidades. É uma das plantas medicinais mais utilizadas e foi a única a resistir aos bombadeamento atómico de Hiroshima. Mas a razão da escolha de Goethe é a forma bifurcada das folhas ('biloba', dois lóbulos), ideal para ilustrar o tema do poeta: a unidade/dualidade.
O poema foi magistralmente traduzido por JOÃO BARRENTO.
O manuscrito original, com as duas folhas coladas pelo próprio Goethe, está no Goethe Museum de Dusseldorf. É a imagem que reproduzimos hoje.


JOHANN WOLFGANG VON GOETHE, in DIVÃ OCIDENTAL-ORIENTAL (1819), in OBRAS ESCOLHIDAS DE GOETHE, vol. VIII POESIA, trad. de JOÃO BARRENTO (Círculo de Leitores, 1992)



GINGKO BILOBA

Esta folha, que o Oriente
Ao meu jardim confiou,
Dá a provar o secreto
Saber que o sábio formou.

É um ser vivo que em si
Mesmo em dois se dividiu?
Ou são dois que se elegeram
E o mundo neles um viu?

Dessas perguntas que fazes
O sentido certo te dou:
Não sentes nos cantos meus
Como eu uno e duplo sou?


(15-9-1815)

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Fotografia: manuscrito do poema original de Goethe (Goethe Museum, Düsseldorf)

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Nota: Esta é a árvore que tenho no meu pequeno jardim e que adoro.