Difícil

É difícil aceitar o inevitável
É difícil assumir os cabelos brancos e todas as manifestações da natureza que nos indicam estar a completar-se o círculo.
Mais duro, para mim, porque vivo duas vidas. A que teima, cá dentro. A que resiste, por fora.
(Se ao menos uma delas se desse por vencida!)
Cá dentro sou como sempre fui. Não há mudanças dignas de nota. Emociono-me, rebelo-me, zango-me, arrependo-me, enamoro-me, sonho, faço projectos, desiludo-me, luto, inquieto-me, recomeço e tenho sempre um olhar no futuro. Não envelheço.
Por fora, vivo ao sabor do ram ram dos dias sempre iguais, conformados, convencionais, indiferentes, apaziguados. Já nada vale a pena.
Uma de mim, não aceita a outra. Não se olham, ignoram-se, recusam reconhecer-se.
Os sonhos nascem e morrem no desespero da falta de atenção, que metade de mim insiste em dedicar-lhes.
E as duas se renovam constantemente, ora  na indiferença, ora na ilusão.
Uma parte atormenta-me. A outra, aquieta-me.
A que reconhece o inevitável, é sacudida pela que se rebela e assim vou vivendo a dificuldade da aceitação.