Sonhar


Achava que os sonhos tinham a dimensão das posses de cada pessoa.
Se uma pessoa não sabe ler, sonha que poderá, de um momento para o outro, ler o jornal, as legendas do filme da televisão, da bula do último medicamento que lhe receitaram. Esse não será o sonho de quem já não se lembra sequer de ter aprendido a ler.
Eu sempre tive pena de não saber música e sonho constantemente poder sentar-me a um piano e tirar dele música de Mozart ou de Chopin.
Na verdade nunca procurei um professor e tentei aprender.
Sou como aquele que desejava que lhe saísse a sorte grande e nem sequer jogava!
Os sonhos, concluo, têm a dimensão do querer de cada pessoa.

A minha casa é do banco!


Um casal festeja a compra da sua casa e entra nela cheio de ilusões.
Tem a conta para amortizar, mas só pede saúde, pois o esforço de ambos já foi calculado mil vezes e está previsto até ao último cêntimo.
Anos depois, um perde o emprego e o outro não ganha o suficiente para assegurar a alimentação da família, os estudos dos filhos, os seus transportes, a sua saúde e a dívida ao banco.
A casa deixa de poder ser paga e o banco vem resgatá-la sem dó nem piedade.
Num leilão, onde aparece aquele apartamento como um simples T3, onde nada mostra o amor com que foi comprado, como foi transformado em lar de uma família que ia crescendo, como foi testemunho de tantas horas de aflição, é rematado a um licitador, ao som do martelo na mesa nua, cumprindo a missão de não deixar o banco sair a perder.