Marionetas de varas

Jardinagem




As minhas plantas andavam a precisar de cuidados e eu sem vontade de tratar de mim, quanto mais delas.
Sentada ao computador, olhava para o terraço e via chover. Pensava que pelo menos, não necessitavam regadas. E a chover, não podia ir para o terraço.
Passavam os dias e eu a trocar o jardim pelo sofá.
Um dia de sol, notei como estavam folhas no chão, outras faltando-lhes bocados, amareladas, com manchas pretas e justificava com a chuva e o vento, na minha falta de coragem de pôr mãos à obra.
Elas chamavam por mim e eu não queria ouvir.
A certa altura resolvi dar uma saída ao terraço, para varrer as folhas. Sentia que no mínimo , deveria mantê-lo limpo, embora a vontade fosse pouca.
Lesmas e caracóis abundavam nos vasos, passeando de uns para os outros num perfeito descaramento, roendo rebentos, folhas, raízes, ali na minha cara, sem a menor cerimónia.
Fui buscar os tais grãos azuis, os que o funcionário da loja me recomendou e espalhei pelos vasos. Lavei o chão com a mangueira na maior pressão e enchi um saco de folhas velhas e alguns troncos, que acabei por podar.
Com a consciência mais leve, voltei para o escritório, fixando-me nos livros, no computador, nos filmes e olhando o terraço, como costume.
Veio o calor e as plantas começaram a crescer, a dar flor as buganvilias, as roseiras, os malmequeres amarelos, os chorões, as trepadeiras, numa festa de colorido.
Num olhar mais atento, um dia destes, achei que estavam com sede, mas havia nuvens no céu e entreguei essa tarefa a S. Pedro.
Como estava doente, já havia duas semanas, qualquer simples tarefa me parecia exigir o esforço de subir a Serra da Estrela a pé.
O Senhor S. Pedro não teve consideração pelas minhas poucas forças e não regou nada.
As folhas das plantas pareciam de pano, tão descaídas e moles, os botões começaram a cair antes de desabrocharem e eu lá resolvi ir buscar a mangueira e regar as tristes sedentas, já quase moribundas. A saúde delas era como a minha.
Nos vasos jaziam sem vida dezenas de caracóis, que escondidos na terra fresca, tinham vindo dar o último suspiro à luz do sol.
Depois de removidos, assim como as ervas daninhas, que com a chuva e o calor se desenvolveram sem medo de nada, notei que havia dezenas de insectos a sugar a seiva das minhas plantas.
Seria possível? Tão cobiçadas eram por todos os habitantes da Terra?
Desanimei e voltei para casa. Pode ser que morram afogados na chuva que o boletim meteorológico anunciava.
As minhas plantas viram-me voltar costas ao seu flagelo e desanimaram comigo.
A minha consciência sussurrava. Que doença é essa que te dá para leres, escreveres e te esqueces da Natureza que está a sofrer? Eu mandava-a calar. As plantas eram minhas, eu é que sabia! Ela, incomformada, desatou aos gritos.
Ontem, finalmente, para calar a consciência, entusiasmada também com os passarinhos que faziam ninho no meu jardim, as rosas que brotavam lindas, mesmo entre a velhas que deveriam ter sido podadas, as flores das tepadeiras que escondiam as folhas de tão exuberantes, lá fui tratar delas.
Podei as velhas, mondei as ervas, deitei em cada vaso uma boa quantidade de estrume de cavalo e reguei tudo com fartura. Por fim, fiz a calda de fungicida e insecticida, aliviando-as das pragas que lhes sugavam a seiva e as deixavam como renda.
Quando voltei para casa, era já quase noite.

A dor de cabeça passara, o corpo e a alma estavam mais leves e até me pareceram mais brilhantes as cores diversas das flores.
Hoje vou tirar fotografias e guardá-las junto das que tirei, iguais, todos os 7 anos atrás.
Enfim, sempre haverá alguma diferença...







Pablo Neruda

José Bernardes

Tiveste saudades minhas?

Quanto de mim se dissolve na areia
esperando ser lavado pelas marés dos teus braços
Na vaga de cada aurora em que não vens
...põe-se um ocaso em cada um dos meus membros
e assim me deixo de bruços
ser engolido pelo mar tão imenso
como a saudade de ti

José Bernardes

The lion sleeps tonight

Fenecem meus sonhos

Fenecem meus sonhos
de tanto esperar.
Minha alma desiludida,
acredita, acredita.
E os mesmos sonhos de menina
renascem
como as flores na Primavera.
Eu olho à minha volta
tantos caminhos andados
tantos desejos anulados
tanta tristeza vivida.
Amanhã será
como a lua em suas fases
o sol nas estações
as rosas podadas
a chuva, o vento
as ondas do mar.
E neste nascer e morrer
minha alma desiludida
acredita, acredita.


Mª Suzete

Um suspiro na noite.



Deixa-me sentar a teu lado, quieta, em silêncio e ouvir-te apenas respirar.
Deixa-me encostar no teu peito e sentir o bater do teu coração.
Dá-me a tua mão para que possa entrelaçar os meus dedos nos teus e amparar na tua força, a minha fraqueza.
Cerca o meu corpo com o teu, sê árvore, nuvem, pedra e espuma.
A vida lá fora marcha em parada militar, fenece em fogueira de raivas e ódios, desfalece de lutas vãs, amanhece cansada de ilusões e ri-se de ingénuas esperanças.
Uma música ao longe embala o meu sonho e eu deito no teu colo toda a luz que o luar não quer.
Fica assim, no escuro, adivinha apenas como me deleito com a tua existência e deixa que te considere meu, que te mostre as minhas lágrimas, os meus suspiros, os meus temores.
Abraça-me e mesmo que amanhã voltes a partir, respira comigo a quietude da madrugada.
Suporta no teu peito o peso do meu cansaço, do meu desamparo, dos momentos tão tristes que a lua apaga, dos gritos sem som, dos gestos de estátua, dos projectos desfeitos, dos desejos adiados.
Fica comigo esta noite. Para ti é uma noite... para mim, a vida.
Se ficares, faz-me acreditar por uma vez, que és só meu.
O vento a cantarolar nas ramadas do jardim, é o suspiro que o meu peito solta nesta ilusão.
Fica comigo e que eu deixe de respirar.


Mª Suzete

A Mãe Natureza

A Mãe Natureza tem-se esforçado por me consolar.
Um casal de pintassilgos aproveitou o fio que coloquei para amparar uma roseira de trepar, ainda frágil e sem capacidade de se manter sozinha na coluna da varanda, para aí fazer o seu ninho e chocar os ovinhos.
Os filhotes nasceram e juntos partiram.
Não precisam mais que umas ramadas de árvores para descansar, depois de voar no céu azul, sem apego a bens, sem invejas, nem ambições.
O ninho começa a desfazer-se, para pena minha.

Infinito




Sentávamo-nos à beira mar,
Olhando o céu estrelado,
As constelações.
O sonho era dourado.
O teu, foi navegar,
Voar.
Eu fiquei à espera,
Olhando o quebrar das ondas,
o rendado da espuma,
o seu constante renovar.
A tua cadeira,
levou-a o mar
para oriente,
para longe.
Eu, guardei em silêncio
o brilho das estrelas,
o cheiro da maresia,
o sussuro do mar,
a insistência em beijar a areia fina.

Mª Suzete

Lutar contra a dor

Tenho tido muita vontade de vir aqui e escrever sobre o que sinto.

A verdade é que ao reler os últimos textos, a dor é tão grande, mas tão grande, que me perco nas lágrimas e nas saudades.

Tenho que lutar contra esses sentimentos, dizem-me os amigos.

Já tentei sorrir às brincadeiras das colegas de trabalho, fazer coisas diferentes do habitual para me motivar, trabalhar nas tarefas da casa, duramente, até me doerem as unhas dos pés e ter as mãos inchadas, sair e passear no centro comercial, nas ruas, no campo, mas a dor vai sempre comigo, como a minha sombra, enfraquecendo qualquer prazer que possa ter.

Será que terei de lutar com espadas, com bastões, com flechas, com pedras, com murros, com fome, com sede?

Ou conseguirei vencê-la com isolamento, com silêncio, com gritos, com gemidos ou apenas com fingir a mim mesma que estou bem?


Ensinem-me como se faz, por favor.