Ser feliz

Os pássaros são os seres mais felizes da Terra.
Podem voar, experimentar a cada instante a liberdade de planar nos céus e ver toda a imensidão de vales, montanhas, rios e mares, do alto das nuvens, sustentados por brisas suaves, ou tomar velocidade em voos mais audazes.
Pisam a terra fresca, acabada de lavrar, com a mesma segurança e àvontade como ainda há pouco eram embalados no ar.
Banham-se nos riachos, nas fontes, em simples goteiras, ou em charcos que a chuva formou.
Vivem em bando, mas sempre junto do seu parceiro, no ninho construído de novo, na ramada mais segura e maternal, que os acolhe sem cobrar renda.
Visitam jardins de mil cores, parques de sombras acolhedoras e ecos inspiradores, searas ondulantes de espigas douradas e papoilas de faces coradas, sem pagar portagem ou mostrar passaporte.
Poisam tão descontraídos no beiral da velha casa no largo da aldeia, onde já não os afugenta o cansado sino que balança na torre da Igreja quando toca a casamentos, baptizados, rebate, finados, ou apenas a reunir cristãos para a Missa dominical, como na varanda sofisticada do palácio senhorial.
Não têm preconceitos, nem escala social, atrevendo-me a afirmar que nem conhecem a escala musical. E cantam maravilhosamente, mesmo quando mais discretos e recatados, fazendo-o quando lhes apetece, sem aspirarem a favores da crítica ou a top de vendas.
Não precisam de roupa, calçado, carros e cartões dourados, porque não querem impor-se.
Não usam jóias ou bijutaria. Não lêem livros, não vêem filmes, não frequentam raves.
Não amontoam bens supérfluos, fazem escrituras ou contratos. Não usam moeda, não têm reforma, nem serviço de saúde, não conhecem a bolsa, as acções ao portador, os títulos do tesouro, talvez adivinhando que tudo cá fica no dia que partirem.
Não conhecem o consumismo, não fazem dieta, não têm crises de identidade, nem precisam de psicólogo.
Não são religiosos de qualquer fé, políticos de qualquer partido, adeptos de qualquer clube.
Ignoram o fanatismo, a corrida ao armamento, o ódio e a guerra.
Não sofrem preocupações, humilhações, pressões ou desilusões.
Graciosos, têm sempre aspecto de estar de bem com a vida, de dançarem e cantarem só por ter nascido o Sol, uma vez mais, cada manhã, sem precisarem de coreografia ou estereofonia.
Não questionam a existência, julgam o passado ou projectam futuros que chegarão ou não.
Apenas nascem, crescem, procriam, morrem, aprendendo com os pais e transmitindo ao filhos a fazê-lo da melhor maneira possível.
Apenas vivem, vivem e vivem, enquanto a vida dura.

1 comentário:

nuno medon disse...

E nós também podemos fazer isso! É só reunir as condições necessárias para isso.... No teu caso, é preciso teres tempo para isso e achar um local sossegado. beijos