Saber

"Terra pequena nunca fez homem grande", diziam na Beira quando eu era pequena.
Nasceram muitos homens grandes em terras bem pequenas, mas não chegaram a grandes ficando por lá. As oportunidades estavam nas grandes cidades.
Para estudar era preciso ir para as cidades e ter dinheiro para poder fazer fase às grandes despesas que isso implicava. Quem tinha dinheiro... continuava, quem não tinha... ia para a serra com os rebanhos, ou para as oficinas aprender uma profissão.
Claro que depois diziam que uns eram inteligentes e os outros não o eram.
Isso tudo acontecia nas aldeias e vilas de Portugal do interior, onde não havia transportes capazes, onde não havia indústria e como tal, as pessoas viviam dos pequenos pedaços de terreno que cultivavam e que lhes assegurava pouco mais do que a panela da sopa diária.
Vendiam o leite de uma vaca que cuidavam como se fosse gente e os queijos do leite que tiravam às ovelhas do rebanho a que não faltavam com a ração, mesmo que não houvesse fartura na mesa para a família.
Vendiam as couves, os espigos e as alfaces, as batatas, as cebolas e as cenouras, que cultivavam na horta atrás da casa.
Faziam o vinho da meia dúzia de videiras, que faziam latada em frente da casa, onde nas noites abafadas de Verão tomavam a fresca no fim de um dia de estafa ao Sol.
As crianças, antes de irem para a escola, ajudavam a tratar dos animais e à tarde, quando regressavam a pé, iam recolher as folhas velhas das couves, os saramagos e outras verduras para alimentarem de novo os coelhos, as galinhas, os patos mudos e os porcos.
Aprender mais do que a ler e a escrever, era um luxo.
Não havia TV, nem se ia ao cinema, à biblioteca e não havia tempo sequer para se ouvir rádio.
Cantava-se no campo enquanto se regava a horta ou se mondava o milho.
Bebia-se um copo na taberna onde ao domingo se ouvia o relato do futebol.
Isto tudo parece que foi há muitos anos atrás, séculos talvez, mas não!
Quem assim vivia, está vivo e tenta adaptar-se aos tempos modernos em que se compram as batatas pré-fritas, os pratos já cozinhados e congelados, em que não se pode fazer o fumeiro, porque as chouriças e as morcelas têm de ter um selo de garantia, em que os filhos estudam o que querem, mal fazem 18 anos "tiram a carta" e fazem férias em terras em que se fala uma língua desconhecida.
Nasceu em terras da Beira, Eugénio de Andrade, mas muito cedo foi para Lisboa.
O mesmo terá acontecido com Miguel Torga, Ferreira de Castro, Aquilino Ribeiro, etc.
Então eu corrijo: Terra sem instrução, não faz homem grande.

1 comentário:

nuno medon disse...

Tens razão! Quando tinha sete ou oito anos e quando ia p Escola da minha Mãe, os alunos levantavam-se ás 6 h da manhã trabalhar para o campo, e muitas vezes iam p escola bem bebidos...bebiam um copito ou dois, iam para a escola e muitas vezes vomitavam Vinho. Mas passados uns anos, isso deixou de ser assim, felizmente. Beijos